Um dos dois principais momentos que despertaram minha independência e autonomia em relação aos meus pais – e que eu me lembre – foram causados por eles mesmos.
Acho que tinha uns 10 anos ou mais. Não tinha o que fazer e fui pedir autorização para minha mãe para assistir TV. Estava uma linda tarde de sol e calor. Devia ser a enésima vez que eu pedia porque ela respondeu aos erros: “- Não! Vai brincar na rua!”.
Naquele tempo, naquele bairro, isso ainda era possível pois o trânsito de veículos era desprezível.
Obedeci automaticamente, acho, ou de modo autômato. Peguei a bicicleta, pedalei duas quadras e, na terceira, descobri o “El Dorado” das crianças: uma dúzia de crianças, da minha idade, de bicicleta e a pé, brincando na rua, com muita alegria, formando um quadro que dava gosto de ver.
Fabian, Dan, Gustave, Henry, Vicky, Alex,… Nós estávamos na Rua 2, mas as crianças vinham da Rua 3, 4 e 1. Também mudaram-se novas crianças, assim como outras iam embora. Rudolph, Helmut, Julie, Mark, Bibi, Lucian, Doug, Tim, Vera, Ned.
O Alex foi o que mais senti por ter partido. A gente se divertia bastante. Ele tocava piano e jogava bola. Na frente da casa dele era uma quadra inteira sem construções. Fizemos cabana, malhamos o boneco do Judas que o pai dele fez… Sua cachorra se chamava Laica, apelido Cai: uma pastora alemã meio misturada. Brava como ela só. Sempre na coleira e presa na corrente, latindo e babando para nós.
Um dia o Alex se mudou para San Joseph. Silvia chamava-se a irmã e acho que tinha uma caçula. Tempos depois ele perdeu sua mãe, Cindy, de câncer. Ainda não era tão comum como hoje…
Eu adorava brincar de “mamãe da rua”. Era sempre em frente a casa da Vicky porque lá tinham duas árvores que davam sombra para a rua inteira. Às vezes a mãe dela dava escândalo: “- Não quero chacrinha em frente da minha casa! Vão brincar para lá!”
A irmã mais velha da Vicky era a Ingrid: bonita e simpática, era o meu ideal de mulher.
As brincadeiras preferidas da turma eram “polícia e ladrão” e os “esconde-esconde”. Uma vez, no esconde-esconde, só faltava achar o Henry e o Helmut. De repente, a gente ouviu: “crec, crec, creeeeec, blaaam”. Era o galho da árvore cedendo com o peso dos dois. Foi risada para todo lado.
O Rudolph também se mudou anos mais tarde. Era um dos lugares que eu passava mais tempo. Lá brinquei de Ji-Joe, ouvi U2 pela primeira vez e ficava tentando arrumar paqueras pelo “disque-amizade”. O pai perdeu a casa no jogo e a família se separou…
A Vicky foi para os USA. Gustave, nunca mais tive notícias. O Henry melhorou de vida depois que a mãe se formou na faculdade. O Ned se mudou para a casa atrás da nossa. A Bibi foi para a capital. A Vera para a costa.
Todos se viraram, seguiram seus caminhos. Reencontrei alguns na rua, outros no Facebook, outros nunca mais… Queria reunir todos, relembrar o que esqueci, reviver o que vivi. Não, não vivo no passado, o passado que vive em mim.
Por Maximilian Köberle
Deixe um comentário